Recentemente, fui a São João del Rei para o funeral de uma pessoa querida. Como acontece nestas circunstâncias, ficamos tristes não só pelo infausto acontecimento como também pela saudade de pais, irmãos, tios que já nos deixaram. No trajeto, a mente volta ao passado revivendo as lembranças, num clima de reflexão e recolhimento entre os viajantes. A natureza é bela e muito inspiradora, destacando montanhas, vales, bosques ainda preservados. Um encanto para quem a curte! Era agosto. Comecei a me distrair vendo os ipês floridos. Ao notar os primeiros foi um encantamento incontido. Ao longo da estrada, para minha surpresa e deleite, vi centenas de árvores, cada uma mais bela que a outra. Árvore é uma maneira de dizer, pois, na realidade, eram verdadeiros sóis espalhados pelos campos.
Fiquei meditando: se estou maravilhado com a natureza e com os ipês, como deve ser o Paraíso. Certamente, algo indescritível. Ora, dona Marta, a pessoa querida que iríamos homenagear, orar e recomendá-la a Deus, era uma mulher valorosa, trabalhou incansavelmente durante sua vida, criou uma família maravilhosa, foi dedicada aos seus e ao próximo. Só poderia estar na glória de Deus. Se a nossa crença é a ressurreição dos mortos, não seria possível, para uma pessoa tão especial, ser de outra forma: aproveitar as delícias do Paraíso. Algo tão deslumbrante que não dá para comparar com as belezas vistas ao longo da estrada. E estar na presença do Criador? Glória infinita dos que creem e o motivo de toda nossa esperança.
Tomando emprestada a poesia de Manoel Bandeira (Irene no Céu), imaginei também a dona Marta chegando ao céu e São Pedro a recebê-la. Ela, na sua humildade, certamente disse: bom dia, São Pedro, qual o meu destino? Ele respondeu: ora, Marta, só pode ser aqui. Vamos entrando, a casa é sua. Com esses pensamentos, já cheguei a São João não tão triste, confortado pela convicção de que estaremos com Deus no Paraíso.
Cumprimos o nosso propósito. Orar por dona Marta e levar o nosso abraço à família. Retornamos imediatamente a Belo Horizonte. Na volta, pus-me a pensar sobre a nossa rotina, o trabalho demandante, as correrias, os problemas do dia a dia, a falta que faz parar um pouco e meditar sobre nosso destino final. Sem muita reflexão, entregamo-nos aos desafios do presente, raciocinando como se aqui fosse o fim em si. Preocupamo-nos com bens materiais, em galgar elevadas posições, numa competição desenfreada, desconhecendo o próximo, sem nos lembrarmos de que tudo isso na terra é passageiro. É preciso ter em mente o provérbio latino: sic transit gloria mundi.
Pensei no seguinte. Se uma pessoa tivesse a oportunidade de passear pelos campos e parasse em frente a um ipê florido, majestoso, desses bem frondosos, como um bloco amarelo quase compacto, poderia meditar por algum tempo, fugindo das correrias diárias. Com adequada concentração, ouviria a voz no vento (é preciso ter sensibilidade para ouvir tal comunicado). Certamente ouviria: você está admirando e se encantando com este ipê. Você tem razão, é uma bela criação minha, mas não se esqueça de que você é minha obra prima. Trate de se cuidar, porque eu o quero de volta. É por isso que plantei 600 mudas de ipê, na fazenda. Produzirão flores amarelas, brancas e roxas. Alguns com três anos já floriram. Infelizmente, pelas demandas do dia a dia, não pude curtir as primeiras floradas. Mas pretendo no próximo ano aproveitar este espetáculo, principalmente para ouvir os aconselhamentos da voz do vento.