Para amenizar a ameaça de não vai ter Copa, uma rede de televisão (que muito investira para ter os direitos de transmissão) divulgou uma série de reportagens sobre os convocados, entre outras iniciativas. Vindos de classes pobres, com dificuldades quase insanáveis, foram apresentados, em minúcias, como super-heróis. O grande objetivo era motivar-nos a apoiá-los. Ora, a maioria dos brasileiros passa por isso. Se analisarmos a vida de muitas pessoas, veremos que enfrentam condições adversas e também vencem. Ajudam a desenvolver o país, em vários campos, porém não são milionários e endeusados pela mídia.
Sobre o fracasso dos brasileiros quase tudo já foi dito. Reafirmo que o resultado foi merecido, por conta (novo modismo da nossa língua) dos preparativos. Jogando em casa, com tantos heróis, o hexa era tido como favas contadas. Assim, dedicaram tempo demasiado para entrevistas, pintar cabelos e posar para comerciais. Só faltou tempo para treinar, traçar estratégias, ensaiar jogadas, estudar os adversários etc. Os poucos treinos foram feitos com presença de público, a ponto de o treinador pedir silêncio em um dos últimos para poder transmitir instruções, se é que as havia. Era o oba, oba, generalizado! Glórias passadas, camisa e entusiasmo não ganham jogo. As seleções candidatas ao título se isolaram, treinaram para valer, analisaram adversários. A seleção alemã dispunha de software, desenvolvido por empresa de ponta, capaz de analisar o desempenho dos jogadores oponentes, seus pontos fortes e fracos, buracos na defesa dos contendores. Trabalho científico de país desenvolvido. O esforço foi coroado de êxito. Nunca antes na história do país viu-se tamanho vexame da seleção brasileira, digno do tempo presente. O placar poderia ter sido mais dilatado, se os alemães não aliviassem. O despreparo foi tal que os jogadores brasileiros ficaram atônitos, sem condição de esboçar qualquer reação.
Embalado pelo crescimento mundial capitaneado pela China, o país conseguiu amealhar significativa reserva cambial, graças à venda de commodities. Lula achou que já éramos uma superpotência e ele, o cara. Negligenciando nossas profundas deficiências em infraestrutura, educação, saúde, segurança, cometeu a imprudência de trazer a Copa e, de quebra, as Olimpíadas, o próximo desafio. Devido à crise de 2008, ele ainda poderia ter desistido da ideia. Se os esforços de organização, energias despendidas, recursos financeiros para construir e reformar estádios fossem empregados em rodovias e portos para reduzir o custo de exportação agrícola, v.g., estaríamos certamente em melhor situação. Cada vez mais, somos exportadores de commodities! Que legado temos a destacar? Elefantes brancos, arenas em estados que não possuem grandes clubes, são atestados da insanidade cometida. Na África do Sul, o estádio da Copa está subutilizado (nossa futura realidade na maioria das sedes) e na Grécia, as sedes olímpicas estão em ruínas. Aeroportos e obras de mobilidade urbana, prometidos, ficam ad kalendas graecas. Incluem-se no planejamento faz de conta dos governos anterior e atual. Fui contra a aventura. Há muito não curto o futebol, pois prefiro que o Brasil sobressaia em outros campos.
O país ainda caminhava por inércia. De repente, parou para a festa do futebol. Resultado: tudo despencou, comércio, indústria, arrecadação, déficit em transações correntes etc. São os piores indicadores dos últimos 10 anos. O carro morreu. Pra pegar, com esses gestores, nem no tranco. Falta credibilidade.
O mundo mudou. Com a Europa em crise e a China crescendo menos, é impossível ter a mesma bonança. As importações continuam altas e brasileiros gastam muito no exterior. A marolinha se transforma em tsunami. O Brasil continua recebendo investimentos externos, mas são direcionados para o setor de serviços, educação superior e saúde, entre outros. O investimento ideal seria na modernização e instalação de novas indústrias. A exportação de produtos geraria divisas, em vez de evasão dos lucros decorrentes de atuais investimentos. Por último, abominei a intromissão da Fifa em nossas coisas. Hoje reconheço que, se isso não tivesse acontecido, algumas arenas estariam inacabadas e o fiasco seria maior.