Fiz estudos secundários à noite, no antigo Colégio Anchieta, da Rua dos Tamoios. Ensinar a uma turma fatigada, após um longo dia de trabalho, era, sem dúvida, um grande desafio. No científico(hoje ensino médio) tivemos excelentes professores (capazes de combater o cansaço dos alunos). Entre eles, tivemos o privilégio de contar com o Prof. Mauro Vilela, na árdua tarefa de ensinar literatura. E ele o fazia de forma inteligente por meio de poesias de consagrados autores. Minha memória fotográfica o vê declamando com entusiasmo, excelente postura cênica e magistral interpretação, p.ex. versos de Os Lusíadas, de Camões:
Canto I
As armas e os Barões assinalados
Que da Ocidental praia Lusitana
Por mares nunca dantes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram….
Foi hábil em inspirar e motivar muitos alunos, entre os quais me incluo, no estudo da matéria. Ao longo do tempo, publicarei poesias que ficaram na memória, graças ao saudoso professor. Começo por Casemiro de Abreu (1839-1860), com o seguinte poema:
DEUS
Eu me lembro! eu me lembro! – Era pequeno
E brincava na praia; o mar bramia
E erguendo o dorso altivo, sacudia
A branca escuma para o céu sereno
E eu disse a minha mãe nesse momento:
“Que dura orquestra! Que furor insano!
“Que pode haver maior que o oceano,
“Ou que seja mais forte do que o vento?!” –
Minha mãe a sorrir olhou p’r’os céus
E respondeu: – Um Ser que nós não vemos
“É maior do que o mar que nós tememos,
“Mais forte que o tufão! Meu filho, é – Deus!” –
Dezembro – 1858
© Casimiro de Abreu
In As Primaveras, 1859